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ATIVISMO JUDICIAL

ATIVISMO JUDICIAL

  1. ATIVISMO JUDICIAL

O ativismo judicial tem recebido demasiada atenção pelos operadores do direito, já que sua atividade acaba ferindo os princípios basilares do direito bem como as disposições da Constituição Federal.

Primeiramente, cumpre expor que a lei maior do Estado brasileiro é a Constituição Federal de 1988, esta que foi elaborada por uma assembleia constituinte, presidida nos anos de 1987 e 1988 pelo então presidente da Câmara dos Deputados, Ulisses Guimarães.

Carinhosamente, a Constituição Federal recebeu o nome de Constituição Cidadã por Ulisses Guimarães, vez que o Brasil havia acabado de sair do regime ditatorial e migrado para a democracia, permanecendo ainda o presidencialismo como no antigo governo, entretanto, tal chefe de governo e estado desta vez era escolhido pelo povo, na qual permanece até hoje.

Contudo, tais fatos não foram únicos aptos a caracterizar a Constituição Federal como Constituição Cidadã, já que esta norma garante os direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça a todos os cidadãos brasileiros natos, naturalizados e ao estrangeiro.

Desta forma, o cidadão que possui um direito violado, poderá recorrer ao Estado com o fito de saná-lo.

Ante o exposto, ainda que de forma breve, pode-se ver que controle do Estado brasileiro é dividido em três poderes, o poder Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Neste sentido a Constituição assim expõe:

“Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”

 

De forma breve, pode-se definir que ao Executivo cabe o poder de administrar o Estado, ao Legislativo o poder de criar ou revogar leis e ao Judiciário a interpretação destas leis e a sua aplicação ao caso concreto.

Assim, resta incontroverso que cada um dos três poderes possuem a mesma importância e relevância, a ponto de que a falta de um implicará na desordem da organização interna do Estado, motivo pelo qual justifica a independência e harmonização de ambos os três, que juntos formam a União.

Contudo, na prática tal sistemática não é tão simples assim.

Como amplamente difundido nos mais diversos canais de comunicação, diariamente se vê que um dos poderes quer atuar como se outro fosse. O Ativismo Judicial surge desta mesma problemática.

O termo ativismo judicial surge em meados de 1947, pelo jornalista norte americano Arthur M. Schlesinger Jr., com a publicação de uma matéria para o jornal Fortune, contudo tal ideologia não se confunde em nada como hoje a conhecemos.

Luis Flávio Gomes (GOMES, 2009) confere a seguinte redação sobre tal matéria:

“O ativismo judicial foi mencionado pela primeira vez em 1947, pelo jornalista norte-americano Arthur Schlesinger, numa interessante reportagem sobre a Suprema Corte dos Estados Unidos. Para o jornalista, caracteriza-se ativismo judicial quando o juiz se considera no dever de interpretar a Constituição no sentido de garantir direitos que ela já prevê, como, por exemplo, direitos sociais ou econômicos”.

 

No direito brasileiro, como já supra apontado, fora conferido ao poder judiciário a aplicação da lei ao caso concreto, contudo tal atribuição se demonstrou demasiadamente ampla e abstrata em alguns pontos dando ensejo ao que a doutrina confere como judicialização.

A judicialização não possui qualquer semelhança com ativismo judicial, ainda que há quem acredite que este último (dentre outros fenômenos) utilize o primeiro como estimulo para a sua criação.

Em termos gerais, pode-se definir a judicialização, como a crescente utilização do judiciário em decidir matérias que a priori seriam resolvidos pela competência dos demais poderes (executivo ou legislativo).

Assim, a judicialização seria então uma absorção de competências de outros poderes para o poder judiciário.

O Ativismo judicial por outro lado é a condição do poder judiciário, na pessoa do juiz (singular ou colegiado) decidir conforme seus próprios valores, utilizando a lei como “mera sugestão”, em razão da interpretação do texto constitucional em lato sensu.

Neste sentido Ativismo Judicial tem como escopo principal a Constituição Federal, já que esta, quando conflitante com outra norma infraconstitucional terá prevalência, até porque, em razão da Constituição Federal tratar dos mais diversos direitos, é comum verificar os mais diversos casos conseguirem chegar ao conhecimento e julgamento do Supremo Tribunal Federal.

Em voto na ADI 5.062, o Ministro Luiz Fux, confere uma redação que demonstra de grande valia para o presente estudo:

Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL, CIVIL E ADMINISTRATIVO. GESTÃO COLETIVA DE DIREITOS AUTORAIS. LEI Nº 12.583/2013. NOVO MARCO REGULATÓRIO SETORIAL. ARGUIÇÃO DE VIOLAÇÕES FORMAIS E MATERIAIS À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. NÃO OCORRÊNCIA. ESCOLHAS REGULATÓRIAS TRANSPARENTES E CONSISTENTES. MARGEM DE CONFORMAÇÃO LEGISLATIVA RESPEITADA. DEFERÊNCIA JUDICIAL. PEDIDO CONHECIDO E JULGADO IMPROCEDENTE. 1. A interpretação ampliativa dos princípios constitucionais não deve se convolar em veto judicial absoluto à atuação do legislador ordinário, que também é um intérprete legítimo da Lei Maior, devendo, nesse mister, atuar com prudência e cautela de modo que a alegação genérica dos direitos fundamentais não asfixiem o espaço político de deliberação coletiva. 2. A gestão coletiva de direitos autorais e a coexistência da participação do Estado assumem graus variados em diferentes democracias constitucionais [GERVAIS, Daniel (org.) Collective Management of Copyright and Related Rights. Alphen aan Den Rijn: Kluwer Law International, 2nd Edition, 2010], o que sugere não existir um modelo único, perfeito e acabado de atuação do Poder Público, mas, ao revés, um maior ou menor protagonismo do Estado, dependente sempre das escolhas políticas das maiorias eleitas. 3. A Constituição de 1988 não estabeleceu prazos mínimos para tramitação de projetos de lei, nem disciplinou o regime urgente de deliberação, circunstância que confere espaço suficiente para o legislador imprimir aos seus trabalhos a cadência que reputar adequada. A interferência judicial no âmago do processo legislativo, para justificar-se, tem de gozar de lastro forte e categórico no que prevê o texto expresso das normas da Constituição da República. Inexistência de ofensa formal à Lei Maior.(...)
(ADI 5062, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 27/10/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-134 DIVULG 20-06-2017 PUBLIC 21-06-2017)

 

Neste sentido, cabe exaltar que o Ministro se limitou o julgamento do fato ante as leis vigentes em virtude de não haver qualquer afronta ao texto constitucional, deixando in albis se diverso seria caso ocorresse tal afronta. Deixando a dúvida, seria tal interpretação, extensiva ou restritiva do texto constitucional? Ninguém nunca saberá, haja visto que o ativismo judicial ocorre nos casos que atentem a moral e ética do julgador, ante as questões sociais e de aplicação de políticas públicas.

Assim, o julgador, ante a necessidade social ou a aplicação de políticas públicas e na condição de intérprete da legislação, confere uma interpretação mais ampla do texto constitucional, aplicando o seu posicionamento e entendimento pessoal sob a demanda a ser decidida, ainda que exista uma lei infraconstitucional que exija uma aplicação diversa.

A Doutrina (POGREBINSCHI, 2000) ainda define que o juiz será ativista quando romper com 3 situações, sendo estas:

“a) use o seu poder de forma a rever e contestar decisões dos demais poderes do estado; b) promova, através de suas decisões, políticas públicas; c) não considere os princípios da coerência do direito e da segurança jurídica como limites à sua atividade”

 

Jean Vilbert (PEREIRA, 2018), confere uma definição parecida, porém mais incisiva ao direito constitucional, que poderá ser ativista o juiz quando:

“1º. aplicação direta da constituição a situações não diretamente contempladas em seu texto. 2º. declaração de inconstitucionalidade de leis com base com critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da constituição. 3. a imposição de condutas ou omissões ao poder público, notadamente em matéria de políticas públicas”.

 

Deste modo, o julgador abandona a sua competência primaria, que seria a aplicação da Lei, e julga conforme a sua vontade, sem qualquer observância à preservação da imparcialidade do juiz.

É importante frisar que o juiz possui como prerrogativa o livre convencimento motivado, contudo não pode tal poder ser utilizado sem limites, pois caso contrário haverá uma concentração dos poderes em apenas um dos três poderes. Neste ponto é válida a lição de Montesquieu (MONTESQUIEU, 1979):

"tudo estaria perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo dos principais ou dos nobres, ou do povo, exercesse esses três poderes: o de fazer as leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou as divergências dos indivíduos".

 

Assim, esta extrema e reiterada interferência do poder Judiciário nos demais poderes acaba por ferir a Constituição Federal, e absorvendo para si, poderes que somente são atribuídos à aqueles que são escolhidos pelo povo, através do sufrágio universal, o que não ocorre no poder judiciário.

Outro ponto negativo que merece total atenção, se debruça na ditadura judicial, já que a sua imposição impede qualquer manifestação contrária, visto que ele é o órgão responsável por decidir as demandas.

Neste ponto, é válido conferir tal atuação como “ditadura judicial” (ALENCAR, 1978), assim como conferido por Levi Carneiro em seu discurso constituinte, bem como a utilização da frase do Ilustre Jurista Ruy Barbosa:

“A pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer”.

 

O precedente jurisprudencial deve-se ater a suas limitações de competência, pois ao judiciário se utilizar desta ferramenta, amparado à uma interpretação extensiva do texto constitucional, poderá antecipar a formulação da própria lei, conferindo o interesse subjetivo acima da imposição Estatal.

Assim, o Juiz em termos genéricos, “aplicar a justiça com as próprias mãos” quando deveria aplicar a justiça conforme a lei!

À título de exemplo, o Desembargador Alexandre Câmara (CARLOS e CÂMARA, 2018) cita uma situação hipotética em que um cidadão realiza um contrato de plano de saúde, em que para tal contrato, uma lei confere que o período de carência para a realização de exame de sangue é de 30 dias.

Contudo, o médico solicita no dia seguinte a contratação do plano a realização de exame de sangue, apenas para exame de rotina, que prontamente foi negado pelo plano de saúde, em que pese, ter sido negado por haver uma lei que regula tal situação.

Aborrecido com a negativa, o sujeito aciona o Poder Judiciário, que nos termos do art. 5º da Constituição confere a obrigação ao plano de saúde de realizar o exame.

Neste exemplo hipotético, verifica-se que não há qualquer prerrogativa suficiente que impeça o usuário de aguardar a carência, já que o exame é de rotina e não haverá qualquer prejuízo a sua vida, saúde, integridade física ou moral. Mesmo assim o Juiz confere tal obrigação, por entender que tal norma atenta contra a Constituição Federal, no tocante ao direito à saúde, vida digna etc.

Ora, o legislador conferiu uma redação para a norma, o judiciário ao somente analisá-la como mera sugestão, acaba por quebrar todos os direitos e garantias inerentes a atuação imparcial e efetiva do Estado ante as relações publicas e privadas, assim como ocorre nos estados absolutistas, chefiados por um monarca!

Outro exemplo, é a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 442, onde prevê a permissão ao aborto até a 12ª semana de gestação.

A legislação prevê uma vedação a tal matéria, junto aos arts. 124 e 126 do Código Penal, entretanto, o partido socialismo e liberdade (Psol) acionou o judiciário para fazer valer um direito constitucional da liberdade, ainda que tenha disposição legal contrária.

No julgamento do HC 124.306/RJ, três ministros julgaram favorável à descriminalização do aborto nos três primeiros meses gestacionais, verificando que tal questão parece estar perto do fim, veremos se o judiciário irá se apropriar de uma questão que em tese deveria ser resolvida pelo poder Legislativo, cometendo mais uma vez o ativismo judicial.

 

Referências

ALENCAR, A. V. A. N. D. A competência do Senado Federal para suspender a execução dos atos declarados inconstitucionais. Senado Federal, 1978. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

BASTOS, A. Judicialização e ativismo judicial: afinal, o que significam esses termos? SAJADV, 2019. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

BAYMA, F. Não cabe ao Judiciário intervir em nomeações do Poder Executivo. CONJUR - Consultor Jurídico, 2020. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. 25 ANOS DA CONSTITUIÇÃO DE 1988. Câmara dos Deputados, 1988. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

CARLOS, A.; CÂMARA, A. Ativismo Judicial. YouTube, Rio de Janeiro/RJ, 06 maio 2018. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

EMPRESA BRASIL DE COMUNICAÇÃO. Você sabe quem foi Ulysses Guimarães? Empresa Brasil de Comunicação, 2016. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

GOMES, L. F. STF - ativismo sem precedentes? O Estado de São Paulo, 2009. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

ISTOÉ. A Constituição Cidadã. ISTOÉ, 2011. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

MARTINS, S. M. Ativismo judicial – TUDO o que você precisa saber. AURUM, 2019. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

MONTESQUIEU, C. L. D. S. B. D. L. Do espírito das leis. São Paulo/SP: Abril Cultural, 1979.

O ativismo judicial no Brasil como mecanismo para concretizar direitos fundamentais sociais. Âmbito Jurídico, 2013. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

PEREIRA, J. T. V. ATIVISMO Judicial: JUDICIALIZAÇÃO da Política ou POLITIZAÇÃO da Justiça. YouTube, 26 jun. 2018. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

POGREBINSCHI, T. Ativismo Judicial e Direito: Considerações sobre o Debate Contemporâneo. Direito, Estado e Sociedade, agosto - dezembro 2000. ISSN 17.

TAMIOZZO, H. C. Judicialização e Ativismo Judicial - Com ou Sem Juízo? YouTube, 24 ago. 2017. Disponivel em: . Acesso em: 11 nov. 2020.

 

 

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